segunda-feira, outubro 01, 2007

Espanto

Mais de 15 anos neste ramo e eu ainda me espanto com o valor que uma nota tem para as pessoas, simples ou não.
O manobrista veio hoje me agradecer: "A senhora não sabe como eu fiquei contente. E a minha mãe, então. Ficou muito satisfeita! Ficou melhor do que eu esperava!"
Ele ganhou o dia dele, quiçá a semana...
Pra mim, são 10 centímetros apenas, ou nem isso. Uma nota falando que um cara lá na Zona Norte resolveu distribuir milhares de doces pra criançada em homenagem a Cosme e Damião. Pra mim, o que esse cara faz é muito mais importante do que o texto impresso num papel que ao meio-dia já estará embrulhando peixe.
Mas pra'quela comunidade, aquela rua, aquela vizinhança, a nota quase no pé da página é a glorificação e o reconhecimento de um trabalho que já vem há alguns anos. "Até saiu no jornal!", alguém lá deve ter dito, com orgulho.
Mal sabem eles que só entrou porque não tinha nada melhor, que era a primeira na lista das que poderiam "cair" e que, pra nós lá, publicar ou não, não teve a menor importância. Ninguém se sentiu melhor ou pior por isso.
Pra gente, ele é um cara em 100 mil, que teve só a sorte de ter um vizinho que é manobrista da garagem onde os funcionários do jornal guardam seus carros. O rapaz é boa praça, perguntou se era possível noticiar, me deu o telefone do dono do feito num papel amassado e eu, por uma lembrança repentina durante uma crise de desespero por causa da falta de notícias, pedi pro estagiário ver o que era.
Isso é o que chamamos de dia-a-dia. E, mesmo sabendo de tudo isso, ainda me espanto.
Talvez não devesse, mas ainda bem que me espanto. Me sinto mais viva e feliz com o espanto.

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