sexta-feira, fevereiro 29, 2008

Calda de morango quente



Você é
doce
doce
doce

Como o sorvete de creme
Mergulhado na calda de morango

Quente




segunda-feira, fevereiro 11, 2008

Primeiro plano - Original

O dedo desliza lentamente e então eu posso senti-la úmida e quente.
Por que não? Se a opção imediata é pela solidão eu devo me acostumar a tocá-la com mais freqüência. E no sexo solitário pode haver mais prazer do que no sexo sem amor.
Na cabeça, lembranças de toques sutis e delicados, palavras doces, situações que emocionaram. Isso basta, eu me pergunto? Se no momento é o melhor que eu posso fazer por mim, sim, basta.
A emoção é um sentimento cruel. Nos abraça, nos chacoalha, vira as nossas vísceras do avesso. Mas é um tipo de dor que não queremos deixar de sentir. Quando não há mais a emoção, a vida perde o sentido.
E eu a busquei tanto que decidi interromper o meu caminho longo e sem emoção.
E isso assusta. Mas fiquei mais assustada no começo, quando eu recomecei sentir. Quando eu percebi que existia a emoção aqui dentro e lá fora, entre as pessoas reais, mas que, ao meu lado, o que tinha era o hábito do convívio e só. Nada de troca. Nenhum interesse. Nem curiosidade. Só afeto respeitoso e a construção de uma imagem equivocada.
E me envergonhei quando me dei conta de tudo isso. O cotidiano fácil, seguro, cheio de certezas nos envolve ao longo da vida e, quando nos damos conta, o sentir ficou em segundo plano. Em que porcaria de mulher moderna eu estava me transformando?
Mas se o movimento é doloroso, ele também é necessário. Estou tão certa da minha opção que tenho até orgulho. Porque a opção foi tão pensada, tão maturada... O caminho foi tão cheio de altos e baixos, descobertas e decepções... Tentativas de recomeços... Reencontros e afastamentos... Levei anos pra chegar até aqui, mas sempre dando sinais, pedindo socorro, lançando avisos...
Mas há situações que não mudam. Há pessoas que não estão preparadas para mudar e nem querem. Cada um tem o seu tempo e eu não me importo se, agora, estou precisando atropelar alguém. Me sinto mesmo um trator.
E é engraçado como nada acontece da noite para o dia.
O limite se deu e não há agora uma segunda via. Também não há como voltar atrás. Não há culpados, nem responsáveis. Só existe uma pessoa, eu, pensando, querendo, desejando e decidindo o que é melhor pra mim. Sem mais nenhum medo.
E sou capaz de chorar de contentamento ao perceber que, pela primeira vez, vou de fato colocar a minha vida nas minhas mãos. Mesmo que para isso o sexo também tenha que ser solitário por algum tempo.

sexta-feira, fevereiro 08, 2008

Como uma máquina

"Aconteceu um problema inesperado. O sistema está sendo desligado. Salve os trabalhos em andamento e acione o logoff."

A gente devia ser assim, como uma máquina. Simplesmente desligar automaticamente quando um problema no meio do caminho surgisse. Salvar o que foi iniciado para, em seguinda, religar e continuar de onde se parou.

quinta-feira, fevereiro 07, 2008

A Dite e os sapatos

A Dite estava linda como nunca. Me surpreendi quando soube que estava com 31, porque quando me lembro dela sempre a vejo mais velha, sofrida, gorda. Mas, hoje, ela estava linda, como uma diva da década de 50, uma atriz de cinema: a pele extremamente branca, o sorriso aberto, com dentes perfeitos, o cabelo dourado e cheio de cachos. Parecia um anjo. Não havia registro do seu mau humor, sua marca registrada de antes.
Todos se surpreenderam. E eu a abracei... que saudades... Eu não sabia que estava com tanta saudades dela. Não imaginava o quanto!
Era surpreendente porque todos a vimos morta. Nós vimos como ela foi definhando e como estava envelhecida quando se foi. Mas, agora, ela tinha 31 e dizia quando via alguém: não, eu não morri. E aquilo era tão natural. Não era nada assustador. Todos estavam felizes, em confraternização. E, para cada um que chegava, eu, como uma criança da casa, fazia questão de mostrar: olha, olha quem está aqui! E novamente expressões de surpresas, abraços, felicidade.

Eu não sei como cheguei naquele lugar. Quando vi, estava naquela casa, que era pequena, mas estava cheia de gente conhecida. Mas tinha que partir e, de novo (essa sensação sempre vem) estava sem sapatos. Alguém na casa me deu dois pares: um sapato lilás claro, meio transparente, bico fino e um pequeno salto; outro preto, completamente baixo. Ambos eram de plástico. Mesmo assim, sai descalça, com os dois pares em uma sacola.

Na rua, de noite, olhei o trânsito, que era frenético. Via luzes dos carros que riscavam a escuridão. Duas grandes avenidas se encontravam no ponto onde eu estava, uma praça na parte baixa de dois morros. Mas a minha noção de sentido estava completamente perdida e não sabia para qual lado seguir: direita ou esquerda. Tinha que pegar um ônibus, ir para o Centro, mas os ônibus subiam e desciam as ruas, que eram ladeiras, e eu não conseguia me mexer.

Aquele lugar, eu sabia, já havia sido uma favela enorme - Mauá agora está bonita, eu pensava, mas ainda assim é Mauá, é assustadora. Foi aí que encontrei a garota. Ela não parava de falar, e me deu o sentido: o Centro é para lá (à esquerda), pegue tal ônibus. Perdi ainda um ônibus e, no próximo, ela subiu comigo, sempre falando, falando, que conhecia não sei quem no jornal, que estudava, que estava voltando da escola, que isso, que aquilo.

Foi só então, no ônibus, que decidi vestir os sapatos. Mas, na confusão de subir, entrar no ônibus, um pé do par preto se perdeu, caiu no chão, eu ainda olhei pra trás, tentei encontrar, mas não consegui. Então, coloquei o lilás. Mas era o preto que queria. Esse sapato lilás com essa meia soquete não combina, ainda pensei. Deve ser por isso que está meio apertado. Pensei em voltar pra, procurar o sapato que ficou pra trás, certamente caído na sarjeta, mas não dava mais.

E a menina não parava de falar, enquanto o ônibus seguia e eu observava meu pé com meias soquete no sapato lilás e transparente.

quarta-feira, fevereiro 06, 2008

Pássaro na sala

Entrou um passarinho na minha casa agora há pouco. Foi mágico. Por alguns segundos me bateu uma empolgação. Porque não sei como ele entrou. Quando vi, ele estava lá, batendo asas, pousando na minha estante, cantando para mim no meio da sala. Nem o cachorro se assanhou para pegá-lo, como que o respeitando. Por um instante pensei: "Passarinho em casa assim deve ser um bom sinal. Vou deixá-lo aqui pelo menos até a Bia chegar pra ver o quanto temos sorte." Mas, de repente, percebi que o bichinho estava lá, mas tentando voar alto sem poder. Ele se batia contra o teto e começou a ficar desesperado. Ia e voltava da estante pra a janela, como que me dizendo que estava buscando a luz. E não tive coragem de esperar. O passarinho só queria sair da minha sala. Então, abri a porta e esperei ele perceber o caminho e sair voando. E ele foi rápido como um raio.

sexta-feira, fevereiro 01, 2008

Vontade da partilha

Não conheço Mariana Terela, mas ela estava outro dia em O Mundo Perfeito, blogue da Isabela, lá de Portugal, linkado aí do lado. É dela a frase abaixo, que eu assino embaixo.

"Há já muitos gajos que sabem que nós, as que nos julgamos imperfeitas, temos de dar largas à imaginação e ao intelecto e a crescer noutros sentidos. Menear o rabo e dar a cabeleira dá resultado enquanto se tem rabo e cabeleira. E enquanto aquilo se põe em pé só com a visualização de um rabo. Mas isso acaba ... as relações que nos aquecem a alma são aquelas que duram para além das aparências e em que o calor e acolhimento de um corpo (e da alma) valem muito mais do que a sua perfeição física. E a vontade de partilha não acaba aos 40 anos. E a perfeição física começa a acabar aqui."