sábado, maio 27, 2006

Sexo

Teve época que tive vergonha do sexo. Acordar nua numa barraca na praia com o sol brilhando do lado de fora, ou ser flagrada por amigos entrando em um motel, era constrangedor.

Depois, achei que sexo era loucura e risco. À luz do dia, em pedras de riachos, cachoeiras, em salas ou quartos ou banheiros de casas de família enquanto a família dormia ou se distraia.

Mais tarde, com filhos, temi que sexo fosse só obrigação, um cumprir tabela, um algo a mais pra fazer.

Como boa aluna e curiosa, fui aprendendo que sexo deve ser o experimentar, o se arriscar, o se entregar.

Hoje, penso que sexo também tem que ser doce, terno e pleno. Tem de estar envolvido com paixão, confiança e segurança.

Por hora, ainda não concluo nada. Na metade que espero estar de minha vida, acho que de sexo ainda tenho muito que aprender.

quarta-feira, maio 24, 2006

I used to love her

But I had do kill her

I used to love her
But I had to kill her

Boa balada essa do Guns... E nessa balada eu penso: vou me assassinar.

Na boa...
Quem me conhece sabe que ando com muito bom humor, mas é que tem hora que uma parte da gente que a gente ama quer matar a outra que não se encontra.

Como me disse um amigo ontem, nós não temos mais idade pra crise existencial...
Mas, eu retruco, por que não?

Ainda nem consegui assassinar de fato a outra parte!
Até gosto dela!
No final, acho que é isso: gosto mesmo mais é da outra parte... Quero mais é que ela sobreviva e vença a batalha!

Lá vem você pensar em voz alta: a Vivi ficou louca de vez!!

Fiquei não, amiga... Sempre fui. É que você se acostumou com a outra. Quer apostar??

terça-feira, maio 16, 2006

Muito bom te ver

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Foi muito bom te ver hoje...
No meio do caos desse dia, sua visão, pra mim, foi como um bálsamo, uma luz no fim do túnel.

Curiosa a minha reação.
Alguém falou seu nome, eu levantei a cabeça, te vi de longe, no meio da roda, e sai num impulso, meio sem pensar, pra simplesmente te falar oi.

...e o abraço foi tão inevitável, e foi tão sincero, e tão bondosamente quente....

Foi muito bom te ver hoje...
No meio do caos da minha vida, sua visão foi um alívio, uma lembrança do que é honesto e bom.

Curiosa a minha sensação.
Pensar que, a partir de um impulso, veio um sentimento tão leve! Depois do abraço um certo constrangimento, ninguém a entender nada, mas a saudades batendo forte, querendo falar mais.
...e o dia que estava amargo, e tão confuso, ficou um pouco mais doce e compreensível...

Foi muito bom mesmo te ver hoje!

Sei que esse não é o seu melhor momento, mas também não é meu.
Mas talvez essa seja a nossa magia.

Porque, ao te ver, e te ouvir, hoje eu senti vontade de rir sem parar.

Talvez porque você tenha sido um exemplo sempre.
Talvez porque você nunca tenha me condenado por nada.
Talvez porque você tenha entendido o que parecia incompreensível.
Talvez porque você nunca tenha deixado de ser você.

sábado, maio 13, 2006

Monte de coisa alguma

(Aviso aos navegantes: esse texto vai ser um saco para quem não tem saco para bobagens e divagações. Melhor não ler. O próximo, prometo, será melhor)

Chego em casa nessa madrugada, não faz nem uma hora que sai da frente de um micro, e tudo em que eu penso é em me conectar de novo. Eu devo estar ficando retardada... Mas não consigo parar de pensar... e respirar fundo... e relaxar.

Devia chegar louca pra ir pra cama, deitar com as duas criaturas que lá me esperam, e que amam, e que me querem, mas eu não consigo... Minha cabeça vai a mil por hora, enquanto meu corpo dói de ponta a ponta.

Mas não penso nada que preste. Nem consigo escrever nada que valha. Me sinto fria como um iceberg, oca e mergulhada numa escuridão que não tem fim. Mas sem culpa. Quem quiser, que me leia e me escute. Tô me lixando.

Solidão...

Outro dia a Bia, com seus 5 anos, me disse que estava só. Dei risada e ela me disse: Estou sozinha de você, mamãe... sozinha de você... sozinha de você... Não consigo esquecer essa frase. Mas não tenho nada pra fazer com ela. Talvez porque me sinta sozinha de mim há muito tempo.

Aqui na frente dessa tela, bebendo minha cerveja Itaipava numa tentativa inútil de tomar um porre, nesse delicioso silêncio da madrugada... Lá fora uma bela lua, o frio de novo seco... Aqui dentro, uma dor sem fim...

Hoje, eu me dei ao direito de mudar todas as rotinas e quebrar todas as promessas. Levei a Bia na escola, cheguei no jornal depois das duas, não fui beber com a Dani, não fui na festa do Hugo, não voltei pela avenida dos Estados, corri na Anchieta, reduzi em Santo André, cheguei em casa pela rua de cima... Tudo diferente pra ver se algo muda, se um milagre acontece...

Mas nada muda.

Daqui um mês faço 40...

É engraçado como esses dois algarismos têm mexido comigo. Quando penso neles e olho pro espelho só vejo marcas, manchas, fios brancos e olheiras. E sei que nem é tudo isso. Mas é isso que enxergo. Tenho impressão de que no dia 13 de junho, um dia depois do Dia D, vai estar tudo caído.

Por dentro, ironia, minha percepção do mundo e de mim passa por um revolução. Uma revolução que me dá medo... Que não sei se vou ver o fim. O fim...

Agora é o fim. Vou dormir.

quinta-feira, maio 11, 2006

Verão Inverno

Eles se conheceram no réveillon, o melhor réveillon de suas vidas. Corpos morenos do Verão, roupas brancas, Copacabana inundada de gente, velas e flores para Iemanjá. Depois, festa com gente descolada. Ela o viu enquanto ele já a examinava. Ela tão linda, com um decote tão bondoso e uma saia tão curta, que sabia: era a caça e também caçava. Ele, voraz, só se aproximou e falou. O jogo estava ganho.

Fim de festa, ela nem se importou com seus amigos. Foi com ele pra praia, molhar os pés no amanhecer. Seguiram pra algum apartamento, que ela nunca saberia dizer onde era, entraram em um quarto e se afundaram no colchão que estava jogado no chão...

No meio da manhã, ela pegou suas coisas e saiu, como uma anônima, mas levou o número de um telefone marcado em um pedaço de guardanapo de papel. Pensava: "Ligo pra ele depois". Chegou de táxi em São Clemente, na casa dos amigos, com as sandálias na mão. Feliz, dormiu e acordou debaixo do sol. Aí veio a notícia: "Você não tem mais nenhum dia aqui."

Atordoada, percebeu que o guardanapo se perdera, talvez no táxi, talvez no banheiro, talvez na sua bolsa. Queria vê-lo mais uma vez. A amiga ligou, então, para uma conhecida, que ligou para uma prima, que também estava na festa, e conhecia o dono da casa, que sabia qual de seus camaradas havia levado lá aquele cara, que entrou sem convite. Uma hora depois, seu telefone tocou. "Vamos sair hoje mais uma vez?"

Foram jantar. Passearam pelas calçadas da Lagoa, de mãos dadas, como velhos namorados, ficaram mais uma noite e fizeram todas as promessas que não devem ser feitas nunca a ninguém. E na manhã do dia seguinte, ela partiu. Mas ele não sumiu.

Telefonemas, e-mails, cartas, cartões, tudo dele a alcançava. Nos primeiros meses, ele saia do Rio para visitá-la em São Paulo e os dois curtiam a vida em quartos de luxo nos hotéis de várias estrelas da cidade.

No Carnaval, ele alugou uma quitinete em Copacabana. Levou os dois filhos: era um casal. A menina tinha 15 e o garoto, 5. Passaram, felizes, o feriadão, passeando entre travestis e transformistas na orla da praia, dançando em bailes chiques, comendo com as crianças em lanchonetes festivas, mas dormindo amontoados na falta de espaço.

Na Quaresma, porém, a vida começou a mudar. Porque a Quaresma trás o Outono e no Outono o tempo esfria e as folhas e as máscaras começam a cair. Algo não ia bem. Os contatos eram estranhos. Na Páscoa, ela mentiu para os pais e viajou de novo para o Rio. Lá, nada de intimidades em hotéis simpáticos ou aps emprestados. Ficaram no quartinho de empregada que ele alugava no apartamento de um velho casal, do lado de lá do túnel, muito longe da praia.

Como sempre, colchão no chão. Mas, desta vez, ele deitou na cama.

Foi aí que ele lhe deu a sua facada: "Se você mente para os seus como vou ter certeza que não mente pra mim?". O ataque enjoou o seu estômago, amargou a sua boca e ela chorou sangue de raiva. A desconfiança é péssima companhia do amor. Ela voltou pra casa, desanimada, mas ainda com esperança de que tudo não passava de um dia ruim.

A vida seguiu e ele voltou para São Paulo, para a casa de sua mãe. Começaram a se ver em hotéizinhos modestos e decadentes do Centro da cidade. Ele havia perdido o emprego no Rio e ela decidira mudar de emprego em São Paulo. Ele não gostou. Ela nem ligou. A opinião de seus parceiros nunca a fez parar. Foi por essa época que ela começou a organizar sua festa de aniversário. Comemoraria os 22. Ele já tinha 30.

Festa no sábado. Ela morava no Tatuapé. Ele no Capão. Apareceu com um amigo esquisito num Corcel preto. Ela não gostou. Mas foi simpático e, ela pensou, tudo ia dar certo. A festa correu bem, amigos e mais amigos, ele não se enturmou e partiu cedo: "Nos vemos amanhã".

O dia importante era o amanhã. Domingo. Era o dia do aniversário dela. Ligou pra ele: "Vamos sair?". "Não, vem pra minha casa". Ela não sabia onde ele morava. Ele explicou e ela pegou o ônibus e depois o outro ônibus, até o ponto final, no bairro humilde da Zona Sul.

Já era Inverno. Pouca gente na rua e o frio congelava os ossos de todos. Na pequena casa, a mãe fazia coxinhas pra fora, enquanto ele, dois irmãos e as duas crianças se amontoavam embaixo de cobertores velhos em dois sofás comprados nas Casas Bahia. Todos assistiam Silvio Santos. Ela entrou e ninguém se mexeu. Nem ele.

Ficou lá, na cozinha com a velha senhora, ele vendo TV e a tarde passando. E ela se perguntando o que fazia lá!

Quase noite, ela decidiu partir. E pediu: "Você me leva até o terminal?" Ela tinha medo daquele lugar onde estava, do lugar onde ele morava. Não queria sair de lá sozinha. Mal-humorado, ele trocou de roupa e foi com ela. Quase uma hora até o terminal, os dois nos últimos lugares do ônibus que sacolejava em ruas esburacadas. Eles conversavam, mas não se entendiam.

No terminal, ele já grosseiro, ela olhou aquele chuvisco cinza, e finalmente percebeu que se cansou de ter esperança. Olhou pra ele com um certo prazer... Ali chegara a sua vez de dar o troco. Ia dar-lhe uma bela facada. Estavam no meio da plataforma. Ela tinha cara de anjo e ele não esperava isso dela. O acertou no meio do peito e disse "foda-se", virou as costas e o largou lá, deitado no chão que tanto gostava, sangrando.

Nunca mais soube dele. Ele nunca mais soube dela. Os dois pegaram seus ônibus e choraram até chegar em suas casas. E depois, simplesmente, se esqueceram.

sábado, maio 06, 2006

O tempo

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O tempo pode ser o melhor remédio, mas também pode ser nosso pior carrasco.
Tenho pensado muito no tempo...

Ele pode clarear nossas idéias, fortalecer relações, pacificar ressentimentos, aliviar paixões...
Mas também pode aumentar dúvidas, aprofundar separações, intensificar mágoas, endurecer ódios.

Sempre busquei no tempo o momento imediato. Minha relação com ele sempre quis ser rápida. Mas, ironia, o tempo nunca me levou a sério.

Meus passos parecem ágeis, mas quando percebo andei muito devagar...
O tempo exercita a minha paciência e eu sou obrigada a me curvar a ele...

O que mais temo no tempo é o esquecimento, apagar da memória os detalhes preciosos dos momentos.

Hoje, nesse exercício de escrever, muito do que me move é a tentativa de registrar, não deixar passar, não permitir o esquecer. Porque acho que já esqueci muita coisa nesta vida. E não quero mais esquecer.

terça-feira, maio 02, 2006

Jéssica

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A Jéssica passou em casa no último domingo. As visitas da Jéssica sempre me deixam desconcertada. Tudo porque eu não sei mais o que fazer... Sua visão me pesa na consciência...

A Jéssica freqüenta minha casa há uns 3 anos. Bateu lá a primeira vez para pedir. Sua vida é pedir. Sua família só sabe pedir. Contam no bairro que a avó dela, Cícera, era o tipo de pedinte às antigas, que todas as donas-de-casa ajudam. Até que Cícera sumiu e seu filho, dias depois, apareceu com cara triste, contando que a mãe havia morrido e que ele não tinha dinheiro para pagar o enterro. O bairro se sensibilizou e todos que sempre ajudaram Cícera deram dinheiro para o seu enterro um pouco mais digno. Mais algumas semanas depois a Cícera volta a pedir pelas casas, muito viva!! Não sabia que estava "morta". Seu filho enganou todos... Esse homem é o pai de Jéssica.

Me sensibilizei de cara com a menina. Começamos a conversar e ela passou a confiar em mim. Sempre vinha com um irmão ou irmã mais novos. No começo, achei que poderia mudar a vida da garota com conselhos, cadernos, livros, palavras, incentivos. Mas sempre lhe dava também comida. A Jéssica e os seus estão sempre com fome. Devoram com gosto as xícaras de café com leite, pão com manteiga, bolo e bolachas.

Para ajudá-la a encontrar um caminho que não passasse pela mendicância, passei a comprar dela bombons. Primeiro, ela pegava de uma vizinha, depois passou a fazer ela mesma em casa. Ajudei a comprar o primeiro material...

Também dei-lhe um pito, para ela não pedir por aí. Percebi que a mãe a obrigava. Disse para a sua mãe que a ajudaria, mas se descobrisse que estava mendigando a entregaria (a mãe) para o Conselho Tutelar. Liguei para a sua escola, tentei mobilizar meio mundo....

Mas a vida da Jéssica é tão difícil... Todas as tentativas se perdem... Fazer bombons, por exemplo, não deu certo... Com sete crianças em casa e geladeira vazia, o chocolate desaparecia sem ela perceber.... Um sábado a flagrei na rua de cima, sentada na calçada com uns quatro irmãos, comendo algo que alguma casa tinha dado. Parei o carro, a chamei, ela ficou branca... Sabia que eu havia descoberto que ela ainda pedia... Como endurecer com a criatura???

A Jéssica é a mais velha de sete irmãos. Quando a olho vejo com vergonha tudo o que falta neste país. Mora num barraco numa favela. No último verão, numa tempestade, um barranco caiu sobre o barraco, que foi destelhado. A prefeitura até refez a cobertura, mas quando chove tudo inunda de novo, por causa das goteiras.

A mãe e o pai nunca se preocuparam em evitar filhos... Meu Deus, prá que colocar oito no mundo!!! De vez em quando, a mãe trabalha em uma frente de trabalho do estado ou da prefeitura e consegue ganhar um salário mínimo. Mas são oito filhos, mais o marido que bebe, mais a sogra Cícera que não pode mais pedir como pedia antes....

A Jéssica sempre diz que a família não tem dinheiro para comprar o gás de cozinha. E ela sai de casa em casa pedindo para as pessoas o dinheiro do gás. Deve mentir... Percebo que tem vergonha de pedir tudo o que precisa... Mas, quando falta mesmo o gás, a mãe acende uma fogueira para fazer a comida, e os vizinhos por motivos óbvios a obrigam a apagar. Não tem coisa pior que fogo em favela.

A Jéssica não consegue ir além na escola. Há anos está na oitava série. Hoje está com 17... A escola diz que a "família é totalmente desestruturada".... Duvido que algum professor, um dia, tenha olhado pra ela...

Outro dia apareceu de noite em casa, no meio da chuva, com um amigo. Eu não estava, meu marido os colocou na varanda, perguntou se queriam comer algo, o que precisavam e mandou me esperarem. Não aceitaram a comida, mas esperaram a chuva passar e desapareceram na noite.

É uma menina angustiada, triste, que sempre parece ter um nó na garganta, uma vontade de chorar e de gritar que não quer essa vida. Parece que sabe que tem um destino de pobreza, e não consegue uma forma de se livrar dele... E eu acho que nunca conseguirei ajudá-la... a Jéssica.