O vidro explodiu de novo no seu ouvido. "Droga!", gritou Ana. Pelo quarta vez no ano os moleques de rua bandidos estouravam o crido do seu carro, no farol, e levavam sua bolsa.
Ela não se surpreendeu. Na verdade, ela ficou com uma raiva enorme, muita raiva, e fez o retorno com o carro enquanto tentava lembrar o que havia perdido desta vez. Não foi grande coisa: um óculo de sol, carteria de motorista, documentos do carro e, aí!, aquela blusa de lã preta nova! O óculos de sol tinha grau, custou uma grana alta! Que raiva!.
E, enquanto vasculhava a sua memória e, ao mesmo tempo, tentava encontrar a delegacia de polícia mais próxima, viu os meninos de longe, correndo com sua bolsa. Pensou em virar o carro de novo e surpreendê-los, mas conteve o impulso. Não valia a pena...
Foi aí que olhou pra sua mão. Estava sangrando. "Quatro assaltos e pela primeira vez eu me machuco". E chorou.... Chorou de nervoso e de medo. "Justo nesta semana que estava indo tudo tão bem!"
Na delegacia pediu pra parar na vaga onde a placa avisa "reservado para autoridades." E o policial, possivelmente penalizado com tantas lágrimas, deixou. Saiu do carro, se sentou na sala de espera e se preparou para o inevitável chá de cadeira que iria passar.
Foi só então que ligou pro marido que, sabia, deveria estar com a filha, sainda da casa de sua sogra. "Oi. Estouraram o vidro de novo no farol e estou na delegacia." "Pô, de novo? Você tá bem?" "Estou. Me cortei um pouco, estou sangrando, mas estou bem!"
E, então, do outro lado da linha, veio a frase mais chocante do dia: "Ah! Então, vê se resolve tudo rapidão aí e vem pra casa."
Ela teve um ataque de pânico. Pânico mesmo, medo do que ele achava que ela era. Tão forte, tão independente, tão eficiente que era capaz de resolver tudo, tudo rápido. "Como rápido? Você tá louco? Eu estou numa delegacia!"
"Ah, tá! Desculpe. Não quis dizer isto." Mas disse.
Nem menção de ampará-la. Nem menção de socorrê-la. Ato falho. Freud explica.
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